14 janeiro 2010
meu tio
De casa ouvi a explosão, depois o grito. Era o rapaz que mora e trabalha aqui em casa. Quase um tio pra mim, pois me viu nasceu, me carregou no colo, tomou conta de mim, assim como o fez com todos os primos. É um negro que mora em um barraco que construímos. Um cômodo, onde ele tem luz, uma televisão e uma cama improvisada. Corri para lá e estava tudo queimando. O álcool que ele usava para cozinhar explodiu com o fogo, queimando seu braço e sua perna; chorava de dor, mas estava tudo escuro, nada podia ver. Horas antes eu chegara em casa junto com ele, que havia dito que fora comprar um frango no supermercado, que a janta de hoje seria boa. Voltei e peguei uma lanterna, vi parte do colchão destruída, o fogãozinho e o frango ainda no saquinho caído no chão. E ele chorava. Tive vontade de chorar com a injustiça desse mundo, tive vontade de reclamar com alguém, de gritar, de fazer alguma coisa para que isso nunca mais voltasse a acontecer. É como se eu tivesse uma dívida para com ele e devesse sempre protege-lo do que o mundo não o havia preparado. É como se eu tivesse uma dívida com todos os ele que existem. É um arrepio antigo que já nem sei mais o nome. Pegamos sua identidade numa bolsinha e o levamos ao médico, tudo está bem, mas o sentimento de injustiça permanece. E eu, ao contar sua história aqui, faço-a como homenagem; é quando percebo que não tenho fotos com ele, talvez uma ou outra num álbum antigo. Novamente aquela culpa e aquela dívida. É que a vida faz a gente ser tão assim como a gente é e o tempo vai passando. Parece desculpa, mas o tempo sempre vai passando...
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2 comentários:
Parece desculpa.
Eu não quero ser desculpada por esses erros.
vai mesmo..
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