29 março 2012

o poste e a ponte

Estavam sentados frente a frente, ou lado a lado – sua memória nunca foi espacial – e tentavam reproduzir coisas que gostariam de dizer. Enquanto um falava o outro entediadamente escutava, mas quando o primeiro resolvia fazer silêncio o segundo punha-se também a falar atabalhoadamente para evitar o silêncio, o que entendiava o primeiro.
Queriam falar sobre coisas importantes, mas nunca souberam exatamente o que era importante na vida, além do mais, será que aquele era o momento propício pra dizer alguma coisa importante? Talvez não, deixa pra lá. Aí outras coisas iam acontecendo e eles iam levando-as – ou tudo – assim como as coisas eram pra ser levadas, ou seja, sei lá o que vamos dizer-fazer-pensar.
E a palavra coisa ia se repetindo a cada vez que algo não podia ser dito ou não havia o que se dizer. Ia-se materializando, passo a passo, o nada frente ao tudo e o apocalipse frente ao gênesis, só que nada mudava e tudo parecia exatamente igual e diferente do seu contrário. Assim como Othelo às avessas, sem Iago e a oligofrenia do negão.
Até que viram um poste, alto alto alto e transformaram em uma ponte longa longa longa e deitaram frente a frente, ou lado a lado – suas memórias nunca foram espaciais – e ali permaneceram por quase meia hora – sempre foram ruins em matemática – levantaram e atravessaram a ponte sem pressa.
Do outro lado se viram sentados frente a frente, ou lado a lado, tentando reproduzir coisas que gostariam de dizer. Enquanto um falava o outro entediadamente escutava.

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