Se algum dia lhe fosse feito uma estátua, ela seria de bronze e ele estaria ali com uma roupa simples, um olhar que acaricia, sofre, mas tem raiva, as pernas ligeiramente arqueadas e os braços, ah os braços, estariam eles estendidos como oferecendo ajuda, oferecendo abraço, oferecendo os braços. E uma vez pedida a ajuda, ele piscaria os olhos, começaria a se mover e desceria para junto do enfermo, pedinte ou necessitado com o olhar terno que se pode dizer agora que se assemelha ao de um franciscano.
Seu nome, Francisco, era nome de orgulho e talvez o que ele fizesse aos outros fosse feito ao seu nome e ao seu orgulho. Ele não era bom e não entendia muito bem sobre a bondade, entendia somente do sacrifício da bondade, das greves de fome da bondade e da solidão dela, talvez por isso tivesse raiva: percebia nos outros o que se podia fazer para ajudar, enquanto que fazer ou não fazer lhe era impossível, já que fazia sem muitas vezes ser requisitado, acabava por sempre massacrar a vida alheia com a bondade. Era sua única arma.
Havia se apaixonado absurdo e exageradamente duas vezes e nas duas se prometera a amar para sempre e assim o fizera, tendo que, sendo sempre o elo mais fraco e tendo que se desapaixonar na marra, na garra, para o eterno e repetido bem. Até seus amores ele massacrou. Com o bem.
Agora, sentado numa pedra de costas para o mar. Há pouco tempo para tudo, sempre. Um dia, faz pouco tempo (para tudo, sempre) havia ouvido uma canção que lhe mudara a vida, pois não lhe trazia o que as outras trazia conforto ou inquietação, ou raiva, ou felicidade, ou indignação: ele havia descoberto na música ela. Foi o primeiro encontro que teve com ela e a partir da canção mais fácil seria esbarrar por ela por aí, ela estaria a espera, assim como a canção havia lhe mostrado sem sinais. Francisco não entendi muito bem o que dizia, sábado e domingo era dela canção.
Ainda de costas olha o movimento que assim passa por ele. Não estava ali para encontra-la, quando a encontrou pela primeira vez, não havia ido para encontra-la, ou será que talvez ele só havia a encontrado muito tempo depois de a ter conhecido? Sabe, por isso, que aos poucos ia encontra-la e que com o pouco tempo para tudo sempre ele não precisaria ter pressa, pois o que era deles já era deles e talvez fosse impossível esse quadro mudar. Sabia, de costas pro mar, que as coisas tomavam um rumo que ele não ousaria tentar adivinhar, muito menos antecipar, ou pular etapas.
Por isso, como em paz, resolve se deitar nas pedras e de cabeça pra baixo pela primeira vez no dia, se é que isso fosse possível olha para o mar. E assim, torto e desconfortável, imóvel como uma estátua, Francisco entendeu o que queria e pela primeira vez no dia sorriu. Havia ganhado um presente.
Um comentário:
Ah mas se ele não se chamasse francisco....
abraço
Postar um comentário