26 julho 2008

composição

É uma composição. Traços, gestos e palavras, um a um selecionados com o tempo e pelo tempo selecionados para se tornarem marcas, índices, estruturas. Acontece é que o mundo não gira ao redor dos traços, gestos e palavras e se gira não é em volta deles somente, na verdade a vida é feita de milhões e milhões de variáveis, como se decibéis tentassem encarcerar todas as canções. E depois que estamos compostos é que sabemos olhar para o mundo, encara-lo e percebe-lo como se observa uma criança, um filho ou uma flor, é deles e neles que vemos o nosso tempo, entretanto tudo disso é submisso àquilo que não muda jamais, como se pudéssemos ser Édipo todos os dias de nossas vidas e tivéssemos como destino a tragédia e a cegueira de todo dia. Pelo menos existe o amor, penso eu as vezes nas horas de mais desespero, mas depois me lembro para meu outro desespero que o amor é sentimento demasiado humano pra ser composto, penso que meu grande amor existe para não estar comigo, porque para mim amor é importante. Se eu preferisse o jogo, o dinheiro, a sorte ou o azar estava com meu amor. É a composição como disse, está tudo composto para a tragédia e dela não ainda sabemos escapar. Não, ainda não é isso, ainda é mais fundo. Estamos compostos para aquilo que aprendemos a controlar: ao sabermos controlar o amor, amamos. Por isso quem mais quer dinheiro, mais o gasta e quem insiste em ser feliz jamais experimenta a sensação. Por isso para mim é tão cruel. É uma navalha.

Aprendi a não gostar do Werther por causa dela, mas creio que para ela ele sempre foi um estranho, como se ele fosse capaz de amar de uma maneira que ela nem era capaz de entender, muito menos de amar, o que não quer dizer que ela não ame, eu mais do que ninguém confio na capacidade dela de amar, mas geralmente as pessoas preferem estar no amor mais do que estar amando, do que ver a capacidade que o amor tem de melhorar com tempo e com a distância. E Werther nesse sentido, com uma angústia que eu já não sinto me mostrou agora essas palavras: “Em vão estendo os braços para ela, ao raiar do dia, quando começo a despertar dos sonhos penosos; à noite, estirado sobre a minha cama, procuro-a, inutilmente, se a inocente ilusão de um sonho feliz faz-me acreditar que estou sentado junto dela, na campina, cobrindo de beijos sua mão! Oh, quando, ainda cambaleando de sono eu a procuro a meu lado, tateando, e, ao faze-lo, de repente acordo completamente, e então choro desolado, contemplando amargurado o sombrio futuro que me aguarda.”

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