21 novembro 2009
sábado
Era sábado e eu jantava antes de sair. Na mesa estavam meus pais comentando da vida, o que se limitava a discorrer sobre uma série de tragédias sobre a morte, que eu não ouvia primeiro porque era sábado e segundo porque não consigo fazer das desgraças um assunto.
Me tornei inerte e aos poucos me vi como uma figura de Goya, sombria e disforme, um tanto quanto assustada, remissa, como se a todo momento pedisse absolvição. Isso porque sabia que devia comer para evitar um pileque e isso porque já me perdoava intimamente do que eu talvez viesse a fazer quando de mim se apossasse o descontrole que eu tanto busco.
Meus pais preocupados em falar da vida e da morte achavam que assim me assustariam, me dariam uma espécie de má consciência que me fizesse aproveitar menos e me cuidar mais. Acham que histórias dos outros são exemplos diretos para mim e não apenas histórias dos outros. No fundo, eles me abraçavam, enquanto em diminuíam.
Então eu saí um pouco menor do que eu sou. Não procurava conforto, mas justamente o contrário, por esse motivo cheguei antes e curti uns vinte minutos sozinho no bar, sem beber, ainda numa tentativa desesperada de me preparar. Até que aos poucos as mesas começam a encher de pessoas e garrafas, os cigarros proibidos fazem uma certa falta, porque a ausência de fumaça releva mais do que gostaria que revelasse.
Chega a pequena. Parece desestabilizar e mais que isso, busca desestabilizar, mas o que ela tem de mim não é bom e o que eu tenho para ela também não, então essa impossibilidade cria uma distância entre o que já existe entre a gente, mesmo que num outro lugar, e o que jamais vai existir. Esse desconforto chega a doer, porque já não sou, nem poderia ser aquele outro e ela ainda é e nem por um momento será aquela outra. A dificuldade é perceber que entre eu, a cerveja, ela e o bar há muitas coisas, mas a maioria delas são só histórias. Assim como as tragédias que contam meus pais.
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