O anão estava sentado em um banco de frente para o mar. Suas pernas que não tocavam o chão se balançavam e logo começaram a doer, por isso teve que colocá-las pra cima, como criança ao fazer um pic-nic. Olhava o horizonte com atenção, o que levou alguns passantes a crer que ele estava pensando, refletindo sobre a vida ou coisas importantes, mas ele não era capaz disso. Era prático e via apenas a água até a metade azul e verde depois, a areia com algumas poucas pessoas e o céu que era azul apesar de algumas nuvens. Nada mais. Murmurou para si: “e dizem que isso é um espetáculo da natureza” e se calou, pois não pegava bem ficar por aí falando sozinho. A natureza estava muda.
De repente um barulho atrás de si. Tentou se virar, mas não foi capaz, então pulou do banco para olhar. Quando se virou, dois meninos vestidos com uniforme de hóquei estavam atravessando o calçadão, um de vermelho e outro de azul. Corriam com muita destreza e o primeiro que com seu taco conduzia o disco mantinha no rosto um sorriso maquiavélico. O anão tentou se encostar na mureta, mas quando os dois passaram, esbarraram nele que virou uma cambalhota e sem controle caiu sentado na areia.
Filhos da mãe, gritou em bom som e logo se levantou indignado. Avançou na perseguição dos rapazes. As pernas curtas demonstraram que nunca iria alcançá-los, mas o ímpeto e a raiva prevaleceram. O rosto em poucos segundos se encheu de suor que se espalhou pela camisa, formando uma escura e densa marca molhada que se misturou a quantidades imensas de areia que haviam grudado na camisa, mas que os pequenos braços não eram capazes de espanar. Desistiu de caçá-los, jovens são assim mesmo.
Acontece que logo quando ele desistiu os rapazes voltaram a se aproximar. Agora o outro liderava o disco com o sorriso endemoniado e o outro seguia atrás. Ao passar, viraram o rosto para o anão que estava xingando, mas não conseguiram ouvir coisa alguma.
O anão voltou a correr atrás deles e os viu se afastarem. Quando de uma esquina apontou um mini-carro de golf com dois policiais nele. Nervoso ele apontou para a direção dos rapazes dizendo: “atrás deles.” mas pelo visto era ele o suspeito.
O carro parou ao seu lado e os dois policiais saltaram.
Você está brincando com autoridade, baixinho?
Não senhor, foram os rapazes, senhor. Me acertaram.
Que rapazes?
Os dois de patins.
Os policiais olharam para os dois lados, mas os rapazes haviam sumido.
O senhor está bêbado, senhor?
Não. Os dois passaram aqui jogando e me derrubaram, por isso estou sujo. Fui atrás deles, por isso estou suado.
Você acredita nele?
Eu não e você?
Eu também não.
Mas seus guardas, eu estou falando a verdade. Pode perguntar pra qualquer um, deve haver uma testemunha.
Olhou para os lados e quase não viu ninguém por perto. Na verdade, um grande silêncio prevalecia e era possível ouvir o som das ondas quebrando no mar.
Isso aconteceu tem muito tempo, senhor?
Não, foi agora agorinha. Tem 2 minutos. Eu estava sentado olhando o sol quando veio o barulho.
O Sol? Mas o sol já se pôs, senhor.
Não tinha ainda percebido isso, mas era verdade. Estava escurecendo o que devia aumentar seu aspecto suspeito. No entanto, aparentemente cansados os policiais se sentaram no meio fio, ficando quase na altura do anão que tentou falar alguma coisa que foi interrompida por um policial.
Está liberado.
Assim? Você não vai atrás deles?
Não há ninguém, senhor. Volte para casa, tome um banho e descanse. Tenha um pouco de dignidade e boa noite.
O anão baixou a cabeça, deu um “Boa noite” constrangido e se retirou dali. Passou pelo banco e pensou em sentar novamente para agora olhar a lua, mas desistiu. Era já hora de ir para a casa e, talvez de propósito, talvez sem querer, foi andando na direção contrária de seu caminho.
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