03 outubro 2011

humor

Nunca achei que eu fosse fazer isso, primeiro porque me parece patético, segundo porque creio que algumas coisas não precisam de defesa porque não configuram nenhum ataque ou ameaça. O que me estimulou a escrever, mesmo que breve e caoticamente sobre o humor (eis o meu tema) foi uma frase proferida ontem por Emílio Surita, apresentador e dono do programa Pânico, no rádio e na TV. Disse algo do tipo: Me solidarizo com os companheiros de humor, essa nova geração de comediantes que está mudando a televisão brasileira e digo aos jornalistas que 'se o humor está mal, o jornalismo também está.'. Essa última frase ficou algum tempo martelando na minha cabeça como se representasse algum problema. Vamos guarda-la por enquanto.
Lembro da função do bobo da corte. O bobo servia para divertir o rei e seus súditos contando piadas, fazendo peripécias e um dos seus instrumentos era a inversão de papéis. Ele se colocava no lugar do rei e fazia suas bufonices como se fosse o tal e nessa posição expunha os vícios dos governantes e até suas contradições. Ora, é claro o papel do bobo. A ele era permitido o que a ninguém mais, ou seja, colocar em cheque o lugar do rei. Como bobo, o que ele fazia ou dizia não era levado a sério e se era, servia apenas como instrumento de divertimento e não recaia como algo que devesse ser levado a serio ou investigado. O bobo, portanto, é o primeiro subversivo do absolutismo e quiçá o último, pois seu instrumento era a observação e a capacidade de atingir o âmago das questões.
Lembro também do carnaval. Bakhtin escreve um clássico sobre a carnavalização na idade média, mas não quero me ater a isso. Quero somente expor a inversão do carnaval. Lugar onde o rei é um bufão e onde quem manda é o malandro, a baiana e a mulata. O carnaval tem tal poder subversivo que, na sua vigência, as leis tornam-se mais sutis assim como os pactos amoroso-sexuais. O carnaval, muitas vezes, expõe um líder frágil e tonto, frente à torrente popular. O carnaval, das fantasias, inverte a ordem do cotidiano e provoca um choque de realidades que é visto com graça, tanto que se diz “brincar o carnaval”.
Vejo o humor atual. O que ele tem diferente de qualquer tipo de humor? Nada. É um humor comum, velho como qualquer outro, mas que parece que havia sido interditado por um humor televisivo de estereótipos. A noção de Freyre de novo se dá no Brasil: Casa Grande e Senzala. Há um humor de dentro da casa e um humor da rua. Uma coisa é permitida aqui e outra ali e ai de quem resolver misturar. Acontece que sempre há novas gerações, e principalmente uma geração internet, cujo humor é produzido dentro de casa e exposto do lado de fora, ou seja, uma geração que não encontra o limite entre cá e lá tão bem exposto e resolver misturar tudo. O humor ganha, pensamos todos, penso eu, pensa o humorista e pensa o cientista político.
Todo mundo concorda que o novo humor é bom e ponto, isso é fato. Aí é uma raça, e agora eu retomo, chamada jornalista, o verdadeiro alquimista do século XXI e transforma tudo em qualquer coisa. A fórmula é simples: tira o humor do humor, pega a frase de humor, agora sem humor e a expõe fora de contexto para que qualquer um leia. Eu leio, você lê, qualquer um lê e pensa: “Que execrável, este senhor feriu princípios...”
Pronto, eis a minha explicação sobre a perseguição ao humor atual. Uma bobagem, pequena, insignificante que os jornalista tentam manter com forno a lenha para que os infinitos e sucessivos programas de debate e as colunas sociais dos sites que precisam ser atualizadas a cada segundo mantenham-se em funcionamento sem que esses profissionais precisem de demasiado esforço, afinal de contas, tem uns caras aí falando umas coisas que não pode, né?

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