Nunca achei que eu fosse fazer isso, primeiro porque me parece patético, segundo porque creio que algumas coisas não precisam de defesa porque não configuram nenhum ataque ou ameaça. O que me estimulou a escrever, mesmo que breve e caoticamente sobre o humor (eis o meu tema) foi uma frase proferida ontem por Emílio Surita, apresentador e dono do programa Pânico, no rádio e na TV. Disse algo do tipo: Me solidarizo com os companheiros de humor, essa nova geração de comediantes que está mudando a televisão brasileira e digo aos jornalistas que 'se o humor está mal, o jornalismo também está.'. Essa última frase ficou algum tempo martelando na minha cabeça como se representasse algum problema. Vamos guarda-la por enquanto.
Lembro da função do bobo da corte. O bobo servia para divertir o rei e seus súditos contando piadas, fazendo peripécias e um dos seus instrumentos era a inversão de papéis. Ele se colocava no lugar do rei e fazia suas bufonices como se fosse o tal e nessa posição expunha os vícios dos governantes e até suas contradições. Ora, é claro o papel do bobo. A ele era permitido o que a ninguém mais, ou seja, colocar em cheque o lugar do rei. Como bobo, o que ele fazia ou dizia não era levado a sério e se era, servia apenas como instrumento de divertimento e não recaia como algo que devesse ser levado a serio ou investigado. O bobo, portanto, é o primeiro subversivo do absolutismo e quiçá o último, pois seu instrumento era a observação e a capacidade de atingir o âmago das questões.
Lembro também do carnaval. Bakhtin escreve um clássico sobre a carnavalização na idade média, mas não quero me ater a isso. Quero somente expor a inversão do carnaval. Lugar onde o rei é um bufão e onde quem manda é o malandro, a baiana e a mulata. O carnaval tem tal poder subversivo que, na sua vigência, as leis tornam-se mais sutis assim como os pactos amoroso-sexuais. O carnaval, muitas vezes, expõe um líder frágil e tonto, frente à torrente popular. O carnaval, das fantasias, inverte a ordem do cotidiano e provoca um choque de realidades que é visto com graça, tanto que se diz “brincar o carnaval”.
Vejo o humor atual. O que ele tem diferente de qualquer tipo de humor? Nada. É um humor comum, velho como qualquer outro, mas que parece que havia sido interditado por um humor televisivo de estereótipos. A noção de Freyre de novo se dá no Brasil: Casa Grande e Senzala. Há um humor de dentro da casa e um humor da rua. Uma coisa é permitida aqui e outra ali e ai de quem resolver misturar. Acontece que sempre há novas gerações, e principalmente uma geração internet, cujo humor é produzido dentro de casa e exposto do lado de fora, ou seja, uma geração que não encontra o limite entre cá e lá tão bem exposto e resolver misturar tudo. O humor ganha, pensamos todos, penso eu, pensa o humorista e pensa o cientista político.
Todo mundo concorda que o novo humor é bom e ponto, isso é fato. Aí é uma raça, e agora eu retomo, chamada jornalista, o verdadeiro alquimista do século XXI e transforma tudo em qualquer coisa. A fórmula é simples: tira o humor do humor, pega a frase de humor, agora sem humor e a expõe fora de contexto para que qualquer um leia. Eu leio, você lê, qualquer um lê e pensa: “Que execrável, este senhor feriu princípios...”
Pronto, eis a minha explicação sobre a perseguição ao humor atual. Uma bobagem, pequena, insignificante que os jornalista tentam manter com forno a lenha para que os infinitos e sucessivos programas de debate e as colunas sociais dos sites que precisam ser atualizadas a cada segundo mantenham-se em funcionamento sem que esses profissionais precisem de demasiado esforço, afinal de contas, tem uns caras aí falando umas coisas que não pode, né?
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