Caetano Veloso no
álbum “Circulador de Fulô” de 92 canta ao lado de "Black or
White" de Michael Jackson um poema-rap entitulado “Americanos” que
em determinado momento diz:
Americanos são
muito estatísticos / Têm gestos nítidos e sorrisos límpidos /
Olhos de brilho penetrante que vão fundo / No que olham, mas não no
próprio fundo. E destacando
essa situação do brilho no olhar americano destaca também que essa
felicidade sem fundo está em decadência: “Americanos
sentem que algo se perdeu / Algo se quebrou, está se quebrando.”
Depois
dessa introdução, que deixo como epílogo sem muitos comentários,
começo a falar de “A Hora Mais Escura” (2012) de Kathryn
Bigelow, vencedora do Oscar 2009 com “Guerra ao Terror” que
disputava na época com o caríssimo e feliz pra foto “Avatar”.
“Guerra ao Terror”, filme de um tédio sem fim - que vale apenas
pelos minutos finais - é sobre desarmadores de bombas em plena
guerra no Oriente Médio. Em “A Hora Mais Escura”, Bigelow se
esforçou para tentar encontrar um buraco mais embaixo, uma
densidade, um sentimento, alguma coisa, qualquer uma, mas novamente a
experiência fracassa.
O
filme que promete retratar a captura de Osama Bin Laden não consegue
escapar daqueles pequenos conflitos de estado entre “uma grande
funcionária (Jessica Chastain) da CIA diz descobrir algo que até
então ninguém descobriu, mas é atrapalhada pelo sistema e pelo governo
que não lhe dá credibilidade.” Aí o filme fica nesse chove não
molha, até que o governo resolve aceitar o plano dela e todos vão
atrás do Bin Laden. “A Hora Mais Escura”, de belo título, é só
sobre isso: uma caçada quase no escuro, e nada mais.
A grande questão, no entanto, me parece
estar naquilo que fala Caetano. O americano olha fundo no que olha, mas não
no próprio fundo e aquilo que não tem fundo, não consegue perceber
o outro. A noção de indivíduo americano, ou seja, quando tudo se
foca em um ser, na preservação desse ser e de como ele é
importante e genial, “uma vida abençoada por deus”, não cabe na
questão Islâmica. Lá não há indivíduo nesse nível, não há
esse conceito, essa noção, então os ataques americanos que para
eles são o auge da vingança, para os muçulmanos são quase
irrelevantes na perda de vidas, mas se configuram como um ato
profundamente ofensivo perante sua crença. E, sem fundo, os
americanos não entendem, ficam perdidos e na tentativa de contar sua
própria história contra os árabes, se mostram tontos, bobos,
infantis, com uma excelente máquina de guerra, mas um
desenvolvimento intelectual, social e político de um nematelminto.
“A
Hora Mais Escura” só serve para os americanos e para o Oscar.
Qualquer outro olho em qualquer lugar do mundo vai ver aquilo tudo
com suspeita, sem empolgação. Com preguiça de reinventar a si
próprio, o filme e os americanos transformam aquilo que era pra ser
heróico em algo particular, quase supérfluo.
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