Passo dado é passo dado, passado, passo riscado do antes como um vetor que aponta para frente, quase pro futuro. É sempre rente ao passo dado que está o que a gente sente, o presente e o que se tem do que ainda não é hoje, mas que ainda será, hoje, porque não há presente que seja para amanhã, porque se assim fosse, não haveria atividade que seria completada. E é desse passo dado que foi se fabulando, foi se construindo o que ainda não era verdade, mas que já não se podia apontar na cara com o dedo é dizer: é mentira.
Estava na cabine telefônica com o fone na mão ouvindo o som da máquina junto com barulhos de carros na rua, chovia de leve, chuva fina de dia de nuvens altas. O cartão estava no bolso, decidia ainda se ligaria, mas como já sabemos, já havia ligado porque o passo já fora dado, no entanto, é sempre bom retomar os momentos anteriores ao agora, não que eles nos expliquem, mas eles são a própria fabulação, não há nada que já não seja cinco minutos antes de ser.
Primeiro havia discado o número a cobrar, talvez porque aquela mensagem de antes servisse de ensaio para o que se diria, apesar de que tudo já havia sido ensaiado. Depois, repôs o fone no gancho e com a mesma mão pegou o cartão do bolso e enfiou na máquina, lembrou-se do tempo em que orelhão era de moedas, tentou imaginar quantas pessoas já haviam ligado daquele orelhão e quantas haviam ligado do orelhão antigo e comprado à moedas seus casos de amor. A outra mão, segurava o guarda-chuva, fechado e apontado para baixo, inflexível, como se metade dela negasse qualquer coisa que fosse fazer e dissesse “se for ligar, que ligue, mas não te darei mãozinha alguma” se é que uma mão pudesse fazer um comentário jocoso desse. Mesmo assim, essa mão não era necessária, a outra parte ia direto fazendo, sem consulta-la. É ela, agora já se sabe.
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