16 setembro 2014

Quando ela vai ler isso?

um poema como um segredo:
um enigma a mostra
ou um espelho meio tampado
num desejo desperto de dar sentido em palavras
àquilo que se viveu na vida

o largo do machado nunca foi tão feliz
e nunca falou tanto, de mãos dadas,
pelas caminhadas nos caminhos da cidade
onde chamar de namorada é uma bobagem pra gente
mas dizer pros outros me faz encher a boca
que saliva seu nome com as mesmas letras que o meu.

as vistas, os videos e as músicas
como pano de fundo para algo urgente
não souberam, também,
o que se passava conosco:

dois corpos, frente a frente,
pernas cruzadas, olho no olho
um mão que encosta no braço
uma outra pendurada no queixo
ou arrumando o cabelo atrás da orelha
um comentário qualquer:
seu olho é bonito
você é linda
posso te esconder no armário?

e a cidade inteira em volta sumindo
o largo do machado vazio
podia tudo explodir
ou congelar
que aqueles corpos,
frente a frente,
sequer se dariam conta
pois de tudo que se passava
só percebiam o tempo que não volta
e a ida
inevitável

esse poema
claro enigma de amor
segredo escondido para todos lerem
está posto no mundo
não como um presente
mas como uma benção
uma lembrança
algo que sei e sabe
que podemos recorrer sempre que quisermos lembrar de uma coisa qualquer

esse poema agora é também seu
e reflete nas minhas palavras
seus olhos
e os olhos de todos que lerem

a pergunta, única,
é apenas uma:
quando você vai ler isso?
e quando você ler, o que você vai fazer?

a história toda é sua...e com você.

05 setembro 2014

conjugado

Dei a volta em meu conjugado como quem mergulha no abismo do mundo
E esperei 
Como quem espera que as paredes se abram como as latas, as gueixas e sésamo 
E percebe que tudo podia ser tal qual num baile infestado de baratas
Em que as pernas mal tocam o chão
E se enfurnam em outras pernas que sobem até os ventres
E se misturam com seios e braços chegando até o nível de uma cabeça ausente

Espero nessa ausência do conjugado mergulhado no abismo do mundo
Que a espera não seja mais do que isso:
Sentar, e nada tocando o nada até que ele seja o mais importante
O nada que sobra e salva
Por isso, sempre que possível, olhar para o conjugado
Não como um lugar pequeno de falta
Mas como excesso, e concentração, e síntese
Como as pinceladas grossas de van gogh ou as estocadas certeiras de um ator pornô.

Plano:
Encontrar em um filme do cine íris luis capucho cantando aids
E ver nas portas das igrejas mais umbrais que santos, mais velhas que velas, mais shorts que shots
Encontrar nos bancos dos largos do machado não aqueles que te assaltam porque eles se escondem pelas avenidas imensas e você sequer sabe se eles existem
Fazer amizade com a moça da barraca de cachorro quente sem sequer ter comido um cachorro quente lá
E estar mais próximo dela porque é a única que vende cerveja na porra das duas da manhã durante a semana
E quando o flamengo ganha é preciso uma cerveja sentado naqueles bancos
Conversando com algum paraíba e alguma gringa (porque todo cachorro quente tem um paraíba e uma gringa, ambos igualmente sedutores)

Por fim na espera e na volta do conjugado
Que me leva ao passeio pelo meu bairro – o único que existe – porque ainda conjugado
Encontrar a espera de repetir tudo isso num loop infinito de coisas que ninguém nunca entende quem sou o que faço
Nossa, aquele baixinho legal engraçado bêbado que faz teatro todo mundo conhece parece legal sei lá
Deixar que a cerveja defina enquanto não encontro nada melhor
A poesia quase sempre me cansa a cabeça
E o mundo não é encantado
Hamlet estava errado
O jogo é meu
E Conjugado.