24 dezembro 2006

natal

Existe na vida alguma coisa ligada aos cheiros. Mais do que os outros sentidos, sinto que as vezes a vida é muito mais ligada a eles. Essa constatação me veio e logo depois algo me iluminou dizendo que o olfato é o sentido mais próximo do sentimento. Ele é quase alguma coisa, é incerto. Ele não atesta nem confirma nada, mas faz julgamentos que nos acompanham por todo o resto da vida.

Hoje é véspera de natal, e é dia de cheiros. Dia de sentimentos. A rabanada que vai se fazendo, a canela e o açúcar, algumas frutas estranhas que só vejo no natal e tenho nojo de me aproximar, as castanhas, os panetones. Conforme anoitece o cheio de peru, chester, tender. Parece-me que isolados, esses cheiros não seriam sentimentos, mas juntos me fazem lembrar que é natal.

Jesus está nascendo para fazer um monte de coisas e morrer na cruz. Sinceramente, eu não acho nada de interessante na vida dele, prendo-me mais as sutilezas. A primeira coisa que acho que não devia ser ignorada sobre Jesus são suas palavras: tudo que ele diz nos deveria movimentar, nos fomentar, não levando a idolatria mas a reflexão. E depois, o que mais me leva a ele são as coisas que permeiam seu nascimento. Tantas coisas, tantos detalhes que levaram a ele ter o seu nascimento, que isso me movimenta a uma coisa chamada luz. A vida é uma luz, e uma vida nascente é a própria luz. Por isso, Jesus nasce, porque ele é luz. Por fim, diria eu que a vida deveria ser de luz, não de Jesus, ou qualquer outra luz, mas A LUZ.

Ou uma luz que dure muito, ou um cheiro que passe logo.

05 dezembro 2006

O meu show de Truman




Não quero demorar a escrever. Quero deixar o meu pensamento livre para ser poético e me abster da racionalidade que tanto vem me tomando nos últimos tempos. Acabei de ver “O show de Truman”, estrelado por Jim Carey. Sim, eu ainda não tinha assistido ao filme, e quando resolvo assistir saio assim: outro.


A força que me impulsiona agora é a de ser meu personagem principal. Será que eu sou? A vida vai te levando de ação em ação, de cena em cena e de capítulo em capítulo, tanto que se você resolver transformar tudo em filme, você perde a vida, se você transformar tudo em vida, perde a poesia, e como viver? Acredito no nosso impulso criador de todos os dias, acredita nessa divindade interna, como se assim como Truman, tivéssemos um diretor/deus, só que dentro de nós, e que não escutamos muito ele, queremos contraria-lo. O diretor sabe da cena, nós não, daí num certo capítulo 10.909 resolvemos por um simples traço de motivo que nossa vida não é a nossa vida, daí pegamos o guidom e achamos que já sabe tudo do mundo e vai navegar por aí. O mundo nos empurra de volta e fazemos força e vamos e vamos, até que chegamos na verdade.


Nós não somos felizes. Truman era, mas não seu pai, não sua mãe, não sua esposa, muito menos Sylvia, seu amor desaparecido. Todos temos um amor fracassado, porquê raios chorar pelo de Truman? Ele era feliz nesse admirável mundo novo, as câmeras sabiam muito bem dirigir a cena, porém ele resolve atravessar o muro. Dá-nos um bom dia, boa tarde e boa noite, vira-nos as costas e atravessa a porta de saída. Boa sorte, Truman. Alguns segundos depois, mudamos de canal.


Luiz Antonio Ribeiro
06/12/06

01 dezembro 2006

outro

"Brigar é estar junto ao contrário.
Já separar-se é mais sério:
é tentar tirar a parte do outro que mora na gente."

Luiz Antonio Ribeiro
29/11/04

16 novembro 2006

Otelo - Shakespeare




ziul diz:
otelo matou a desdêmona, mor

ana diz:
vc tá lendo otelo já?


ziul diz:
ele estrangula ela.

ana diz:
O.O pq?

ziul diz:
pq ele acha q ela está traindo ele com o Cássio, o tenente dele, mas é tudo intriga do Iago.




ana diz:
que novela mexicana, hein?

ziul diz:
mas ai, o Iago é desmascarado pela própria mulher, e sabe o q Otelo faz?

ana diz:
o q??

ziul diz:
nao aguenta o q fez, e se apunhala com uma espada, e se deita na cama, onde jaz desdêmona morta. os dois morrem abraçados, com o enxoval da sua primeira noite de núpcias

ana diz:
ai que lindo, mor vamos morrer assim??
então vc já acabou de ler, é?

ziul diz:
e sabe o q acontece com o Iago?

ana diz:
o q?

ziul diz:
NADA. ele só é ferido e vai preso.está hora está vivo, numa prisão do Chipre

ana diz:
hauhauahaoo mundo é o lugar mais injusto

ziul diz:
tambem acho...difícil viver assim.

15 novembro 2006

Por que eu escolhi a profissão de artista?

Curso: Teoria do Teatro
Matéria: Psicologia – PSI
Aluno: Luiz Antonio Ribeiro



Acredito que a escolha dessa profissão é motivada ou impulsionada por um desejo de sucesso exterior, ou por uma necessidade de arranjo interior. Em ambos os casos a solução está no sucesso estético, ou seja, existe algum tipo de desarranjo ou desarmonia na forma de viver, e a gente resolve isso através da forma, da expressão, da estética. É a idéia platônica de atingir o belo, e uma vez imerso nesse mundo a conclusão pode ser variada, chegando-se até ao polo oposto do que se propõe.

O meu caso é parecido: sou o filho único da irmã mais velha que ficou 13 anos casada sem engravidar e no parto perdeu o útero. Sempre fui o menor, o mais baixo, talvez o mais fraco, pois nunca ousei brigar. Tive uma carreira infantil no futebol interrompida por desgaste de tendão e musculatura (o mais baixo tem de fazer um esforço excessivo). O que me achou então? A arte.

Para mim, foi o natural caminho de entrar para o coral, para a gincana da rádio na escola, para o grupo de teatro. Depois foram as aulas de teclado e violão, o programa de entrevista feito com os amigos da escola. A resposta dos outros era sempre a mesma: “Você tem muito talento, devia seguir carreira.” E com a bola levantada pelos outros e o arranjo interior acertado, eu podia e tinha a liberdade de tentar outras coisas como escrever, dançar, etc.

Como problema, a primeira coisa que encontrei foi a instabilidade, pois na arte o material sou eu mesmo, logo não adiantava tentar escrever sobre amor, sem viver amor, ou saber sobre o amor.
Ou então, interpretar uma personagem que eu não conheço tão bem, ou que, seja o oposto de mim. Nesse momento, me veio duas necessidades, a de aprofundamento técnico da área e da aquisição de experiência de vida.

Daí, resolvi por fazer um curso teórico enquanto eu não passava para teatro. Caí então, meio que por sorte no curso de letras que fiz por três anos. Eis um outro problema: letras é mais profissão que teatro e ao passar para teatro houve a crise familiar e interna pessoal.

No entanto, a escolha estava feita, a vontade e a satisfação se sobrepõem ao resto, assim, aqui estou.

Luiz Antonio Ribeiro
15/11/06

05 novembro 2006

Van Gogh - trechos



“Sinto em mim um fogo que não posso deixar extinguir, que ao contrário, devo atiçar, ainda que não saiba a que espécie de saída vai me conduzir. Não me espantaria que essa saída fosse sombria. Mas em certas situações vale mais ser vencido que vencedor.”

- VIDA

No mês de maio, deixou a clínica e voltou a morar em Paris, próximo de seu irmão e do doutor Paul Gachet, que iria lhe tratar. Este doutor foi retratado num de seus trabalhos: Retrato do Doutor Gachet. Porém a situação depressiva não regrediu. No dia 27 de julho de 1890, atirou em seu próprio peito. Foi levado para um hospital, mas não resistiu, morrendo três dias depois. Suas últimas palavras foram:
“A tristeza durará para sempre.”


- OBRA


Esse é o trágico: ver a realidade e ver-se na realidade com uma evidência tão clara e peremptória. A arte para ele se tornou o ofício de viver, no entanto, uma vida onde toda a percepção que lhe apresenta só lhe torna mais só, e sua solidão já não é mais suportada. Está tendo constantes alucinações.

“Não sei bem quem definiu este estado: ser atingido pela morte e pela imortalidade. A carga que nós arrastamos deve ser útil a alguém que não conhecemos. É assim, se acreditamos na arte nova, nos artistas do futuro, o nosso pressentimento não nos engana”

Ele já se despedia da vida, apostando na imortalidade na arte. Entre um milharal, enquanto caçava gralhas, aponta a arma ao peito e atira, se arrasta até em casa onde encontra o irmão com quem conversa, num último instante diz:

“A tristeza durará para sempre.”

Pretende-se, no entanto, guarda dele está afirmação:

“No futuro há uma arte, e deve ser tão bela e tão jovem quanto verdadeira e, e atualmente nós lhes deixamos nossa juventude, não podemos senão ganhar em serenidade.”

Cézanne - trechos.

“Eu tinha decidido trabalhar em silêncio até o dia em que seria capaz de sustentar teoricamente minhas tentativas.”
Paul Cézzane



VIDA.


É recusado, em 1866, 1869, 1870 e 1871 no Salão, envia, por sua vez uma carta de protesto ao diretor das Belas-Artes, aproximadamente a época em que conhece Manet que elogia suas naturezas mortas. Em 1872, instala-se com a família em Auvers-sur-Oise, onde pinta quadros com Pissarro. Logo, em 1873 pinta na casa do doutor Gachet. Trava conhecimento com o negociante de tintas Julien Tanguy que troca material de pintura pelos seus quadros. Encontra Van Gogh na casa Tanguy. Tem sua primeira exposição coletiva, em 1874, dos impressionistas, na já citada do fotógrafo Nadar. Os quadros de Cézanne fazem escândalo (A Casa do Enforcado em Auvers, Uma Olímpio Moderna). Participa, em 1877, na terceira exposição impressionista com 16 quadros e suscita ainda uma vez mais violentas críticas.

Em 1885 é outra vez recusado no Salão e decide não enviar mais obras para lá. Ruptura com Zola após a publicação do romance L’Oeuvre que descreve a vida de um artista falhado. A National galerie de Berlim compra um quadro de Cézanne. É a sua primeira tela num museu.

OBRA.


Ora, os expressionistas buscavam representar o mundo de forma pessoal, ou expressavam o pessoal amparando-a numa representação do mundo, porém não seria essa busca de comunicação por meio da pintura uma característica do mundo? Do outro lado, os impressionistas, por mais sensíveis que fossem nas suas impressões, não elaborariam na imagem conteúdos pessoais? Ou seja, não seria o “ver” também uma “maneira de ver”?


Cézanne é o centro dessa questão. Ele não aceita essa pintura puramente visual de seus amigos impressionistas, quer ser um mais um literato, porém quer literar na pintura, não levando o tema à pintura, mas construindo essa imagem com os pesados materiais da pintura. Está no meio dessa impressão e dessa expressão. Nessa pintura nada é invenção, tudo é pesquisa.

26 outubro 2006

metáfora

Estava tudo alagado, mas a tempestade já havia passado. O caminho pelo qual eu sempre passava, agora era de barro molhado, mas ainda era caminho e ainda se via alguns vestígios de asfalto lá embaixo. Por ser estrada tão conhecida por mim, não chegava a me causar espanto vê-la nesse estado, que por vezes, eu já havia previsto poder se tornar assim.

Havia o caminho, havia a lama. Havia a trilha, como se alguém tivesse passado por lá antes de mim e tivesse estipulado uma linha, não muito reta, por onde todos deveriam passar. A trilha não era atalho nem era mais fácil, era, no entanto, uma segurança se descobrir compartilhando as coisas. Uma vez Clarisse me disse, apesar de não a ter conhecido, que o que nos protege da solidão é a solidão de todos nós. Era isso o q sentia ao atravessar a estrada: sentia-me sozinho, mas não o único sozinho por ali.

Havia o caminho, a lama, a trilha. Havia também o outro lado. Esse eu não conhecia, presumia. Poderia dizer que era minha casa, já que pouco antes disse ser uma caminho conhecido. Poderia dizer que era a casa de um amigo, um parente, poderia ser um bar, poderia ser uma infinidade de coisas que o andar era ocupado pelas especulações. Hoje, vejo que não importa esse destino, importa ir para lá e que chegar foi apenas meu ponto de partida.

Havia o caminho, a lama a trilha e o outro lado. Havia as palavras e as metáforas, que encarnavam coisas que eu, ainda hoje em dia, não sei.

Luiz Antonio Ribeiro
27/10/06

02 outubro 2006

sofista

Por alguns minutos fiquei com a tela em branco e o traço piscando à espera do primeiro comando meu. Eu, olhando a tela em branco e o traço piscando, tentava descobrir e depois entender aquilo que eu já sabia que eu queria escrever, mas ainda não havia organizado em linguagem, e esse é meu medo: que haja um abismo entre o que penso e o que eu digo. Eis que a idéia aos poucos toma forma e já me aparece com um sintagma: Vejo...

Vejo no mundo um equilíbrio de idéias. Nada mais prevalece como verdade ou como mentira, ou como certo ou errado. Adolescentes em plena crise andam sofrendo bastante com isso, quando tudo parece tão certo, as certezas são tantas e os rumos parecem tão marcados, num segundo lá vai a vida levando tudo embora para que seja tudo reescrito com outras perguntas.

Não que isso seja um problema, ou uma crise, na verdade, é resultado de uma democracia levada a sério demais. O ponto que eu quero vou descobrindo aos poucos, e chegando ao que eu quero dizer é: isso é um sintoma. Sabe sintoma? Não é a doença propriamente dita, mas anuncia doença, precede a ela, encaminha à ela. Muitos irão dizer dos prazeres da democracia e dos problemas de um autoritarismo e eu concordarei. A democracia é um presente, mas a liberdade e a potencialidade assustam.

O mundo contemporâneo é marca de efemeridade. Nada positivo pode durar para sempre, a não ser a promessa de um amor, pois nem o amor está sendo eterno, uma vez que nos últimos anos eles andam "sendo eternos enquanto duram". Acontece que o efêmero deixou no ar uma idéia de que toda idéia é válida, uma vez que ela será rapidamente trocada por outra, então o que for mais eficiente em suprir uma necessidade urgente vira escolha de uma eterno "carpe diem" subvertido.

Esse relativismo absoluto abriu uma gama de possibilidades mercadológicas, pois o fugaz é publicitariamente mais rentoso, pois gera divisas em curto espaço de tempo e constante propaganda barata de curta duração. Assim, o mercado de certa forma adotou os filhos do carpe diem, mas não é disso que eu quero dizer. O que eu quero dizer é desse relativismo democrático efêmero sintomático. Aliás, nem sei se quero exatamente dizer isso.

O mundo de hoje é sofista. Isso que eu queria dizer. Tudo se equivale e se transfere. Não existe essências, mas aparências móveis. Não existe modelo, existe diversidade. E nisso o mundo se perde em teoria, em fugacidade e em..distrações. O mundo de hoje é distraído e desfocado. É desencaixado e frouxo.

E o povo não sabe votar.

23 setembro 2006

SÁBADO

Ela sussurra ao meu lado. Não sei se de dor ou de amor. Está doente. Porém, muito mais frágil que doente. Ela precisa que agora eu a olhe, sorria e lhe diga que tudo ficará bem. Ela vira para o canto como quem vai dormir, como quem quer sonhar comigo. Suas últimas palavras foram: “Me dá um beijo.” Eu dei. Sinto por ela o que nunca senti. Mesmo sabendo que nunca experimentamos um mesmo sentimento duas vezes na vida, sinto o dela pródigo, daquele que vivemos sem, mas que sempre recebemos fartamente de volta na gente.

O silêncio é o melhor amigo da noite. Às vezes, carros passam e furam o silêncio. Hoje não tem lua, não tem estrelas, o céu está quase nublado. A igreja ao lado toca o sino e as luzes lá fora começam a se apagar. Enquanto ela, ao meu lado sussurra. Não sei se dor ou de amor.

Luiz Antonio Ribeiro
24/09/06

05 setembro 2006

o Chocolate


O chocolate era muito triste
Porque não queria ser marrom
Então, ele teve uma idéia genial!
Resolveu se olhar no espelho
E se pintou de vermelho.

Mas ele não gostou do vermelho
Porque ninguém queria comê-lo
Então ele se pintou de azul
E fugiu para o sul.

No sul todo mundo
tinha frio
Então ele voltou para o rio.


Luiz Antonio Ribeiro
livro de poesias da 4ª série

10 agosto 2006

tapete vermelho


Triste. Acabei de constatar que não sei mais escrever. O pobre traço da tela do programa de texto do computador fica piscando e piscando e nada das frases chegarem. Outrora era batata, bastava escrever uma frase ou duas e já tinha toda uma sentença pronta, e outras mais, e a idéia do texto se formava, as vezes sem nexo algum, mas sempre chegando ao "belo" grego, ou grego "belo", viu?, já não sei.

A idéia era escrever sobre o filme "Tapete vermelho" de Luiz Alberto Pereira que assisti a poucos dias atrás e tanto me marcou, no entanto, parecem me fugir os argumentos, ou os tenho de forma caótica e inapresentável. O fato é: O Mazzaropi foi/é um grande gênio do cinema nacional, possuia um sistema de criação único e que se tivesse sido mantido, poderíamos ter um "centro do cinema nacional", a lá hollywood. Gosto dele por isso, e por causa do grande ator e roteirista, mas principalmente, gosto afetivamente: Meu pai gosta, porque meu avô gostava, minha avó gostava, meus tios gostam. Quando pequeno via e me divertia, hoje vejo e me divirto. E "Tapete Vermelho", a história do pai que leva o filho para ver o filme do Mazzaropi, é totalmente "mazzaropiana", assim como o texto, o cenário, a interpretação, o figurino. Matheus Nachtergaele foi meu Mazzaropi por uma hora e meia, e a todo momento eu pensava: "preciso alugar esse filme para meu pai".

O enredo é simples, mas interessante é a forma de utilizadas para sub-temas. Eles tratam de lendas e manifestações populares rurais que mesmo quando inverossómeis a nossos olhos, são completamente pactuadas por todas as persoagens. Como exemplo, temos a cena do violeiro que vendera a alma para o Diabo ou a aparição do Anjo Gabriel.
De qualquer forma, não é de forma teórica específica que conseguirei falar do filme, mas sim, como comecei: afetivamente. E digo que veria de novo se fosse possivel, e assim que sair em vídeo, alugarei para meu pai.
Foi díficil, mas escrevi. Temo ter ficado ruim. E ficou.

03 agosto 2006

Manutenção.

Eis que o mundo continua girando enquanto eu vivo.
Eis que o mundo gira enquanto eu amo.
Estou prestes a voltar a ver que o mundo gira e a girar junto com ele.
Não quero.

29 julho 2006

xerox


Se descarto a idéia minha, tão saudável
É que encaro o mundo só nessa visão
Se copio a coisa e faço duas coisas
A segunda sempre é repetição

23 julho 2006

linguagem

desculpa avisar, mas no fundo tudo no mundo é linguagem. E tentar definir é uma questão de nomenclatura e ponto de vista.

18 julho 2006

brain strom

Quanta coisa a gente perder por não estar pronto. Não estar na hora certa, não no sentido de tempo, mas no sentido de vida. Quanta coisa a gente perde por não estar a gente o suficiente pra perceber tudo que a gente pode ser e receber do mundo. A idéia desse post é escrever tudo o q vem a cabeça em exatos dois minutos, sei que a tarefa é difícil e que chega a assustar, mas vou tentar. Eu estava pensando que as cores das coisas são sempre bem menos coloridas do que a gente as vê, porque quando a gente olha, a gente põe o nosso sentido humano nelas, por exemplo, seria o mundo tão verde, se os seres humanos não estivessem aqui para olha-lo?? talvez sim, porque não existiríamos para destruir todo o verde, ou talvez não, porque o verde, de certo modo, só é verde porque está nos nossos olhos. Fim do tempo, fim do post.

04 julho 2006

desencaixe

Pedro tinha feito uma longa viagem até o paraíso. Assim que morreu, pegou uma imensa tempestade que o impedira de subir, além de Ter sido atrapalhado por alguns espíritos que vagueavam e pediam informações sobre o caminho do céu. O menino limitava-se a responder sempre a mesma coisa:

-Não sei dizer. Não sou daqui.

Chegando lá em cima, descobriu que o céu não era de nuvens, mas era todo azul-piscina, menos o portal de entrada que era rosa, o que lhe fez dar risadas. Foi recebido por São Pedro.

-Ué, São Pedro, você não tomava conta do tempo?

-Não, meu filho. Alias, sim, ainda cuido. Mas com o decrescente número de santos que vem aqui para cima estamos tendo que nos dividir.

- E eu vou poder entrar no céu?

São Pedro não respondeu, mas o portal logo se abriu, e Pedro pôde perceber que sim. Ficou feliz por ver que era um bom menino, ao contrário do que dizia sua mãe, mandando-lhe sempre comer. Lá dentro foi guiado por São Jorge que mostrou-lhe tudo, apesar de estar sempre preocupado, olhando o relógio e ajeitando sua espada. Finalmente foi deixado em seu aposento, que era um quarto simples, parecido com o seu, e o mais legal era: o céu não tinha cantos, mas tinha parede. Eram finas e serviam apenas para as pessoas se sentirem um pouco vivas, e agüentarem a eternidade. Numa oração perguntou se não veria Deus e no próximo sonho obteve a resposta: "você viu todos os dias de sua vida", desde então resolveu não mais rezar no céu.

Em pouco tempo, estava familiarizado com todos por ali, inclusive com Santo Antônio que tinha sempre uma criança ao colo e tinha cara de pedófilo, mas no fundo, era boa pessoa. Foi encarregado de ser anjinho e tocar harpas para receber os visitantes. Ah, as pessoas que iam para o inferno, visitavam mensalmente o céu, para ver o que perderem sendo maus. Pedro aprendeu no curso de anjo que reencarnação existe só para os que vão para o inferno, eles ficam lá um tempo, pagando os pecados, depois voltam para a terra. "Por isso tem tanta gente ruim por lá", pensou o menino.

Sua sala de aula era uma bagunça, porém a bagunça mais organizada, todos brincavam e conversavam, mas aprendiam. Tudo corria bem, até que entra na turma uma menina: pequena, magra, cabelos encaracolados e ruivos. Pedro não percebeu seus olhos brilhar, mas sentiu o coração palpitar. Tão bela e tão frágil era a menina, que todos a admiravam, Pedro muito mais. Amava-a já e em uma semana não se aguentou e foi falar-lhe:

26 junho 2006

saco preto

A quase dois dias e meio, um saco preto voando no chão
A quase dois dias e meio, um saco preto voando no chão
A quase dois dias e meio, um saco preto voando no chão
A quase dois dias e meio, um saco preto voando no chão
A quase dois dias e meio, um saco preto voando no chão

A dona preguiça jogou
Menino travesso chutou
Lixeiro rico não é

preto voando no chão
saco preto voando no chão
um saco preto voando no chão

O carro voado passou
Porteiro pro canto empurrou
Menina amada não tá

Voando no chão
Saco voando no chão
um saco preto voando no chão

a dona jogou, menino chutou, carro passou, porteiro empurrou

e a quase dois dias e meio, um saco preto voando no chão

Luiz Antonio Ribeiro
26/06/06

18 junho 2006

sobre "o varal"

ziul diz:
eu to numa fase muito cecília meirelles..
ziul diz:
ontem fiz uma poesia pra um varal.

tatty ... diz:
pra um varal?
tatty ... diz:
eu quero ler o que voce escrteve

*** *** ***

ziul diz:
VARAL

Pendura-se tudo:
A calça, a blusa, a toalha molhada.
O tapete, o lençol, o cobertor
Até a cueca que tanto se esconde na roupa

ziul diz:
isso é um trecho.

tatty ... diz:
a ideia tá boa. eu queria saber fazer poesia

*** *** ***

tatty ... diz:
caraca, fiz uma viagem aqui surreal.
tatty ... diz:
tipo, varal é onde a roupa suja é colocada depois de lavada. pensei em algo tipo boteco, que você acaba lavando riupa suja de vez em quando e acaba tudo entre amigos depois.

ziul diz:
bom...a idéia era q nao fosse só varal..pq ia ser mongol ser só varal.
ziul diz:
mas nao pensei em boteco nao.

tatty ... diz:
o boteco na verdade foi a parte mais dispensavel de tudo.
tatty ... diz:
foi só pra colocar um lugar fisico

ziul diz:
entao me responde:
ziul diz:
Sendo varal pra secar,
quando chove e tudo molha
ele deixa de ser varal?

tatty ... diz:
não deixa de ser varal. mas ele vai ter caracteristicas novas.

ziul diz:
a minha viagem é: ele é varal só pela utilidade ou por algo mais.
ziul diz:
pq se for pela utilidade, qd a perder deixa de ser

tatty ... diz:
eu não tô pensando em varal como coisa fisica. to viajando em metaforas
tatty ... diz:
as vezes o fato de molhar, não quer dizer que vai estragar. só quer dizer que ele se alterou um pouco.
tatty ... diz:
a função dele não necessariamente foi desfeita

ziul diz:
eu agora to com mania disso qd escrevo...de pensar numa frase q a própria linguagem nao responda.
ziul diz:
dai a gente tem q ficar viajando nela.

tatty ... diz:
mas viajar é a melhor parte

*** *** ***

ziul diz:
mas tipo, eu achei bonito o varal ser arte enquanto o menino suja e a moça lava
ziul diz:
é como se fosse arte de vanguarda...ou arte de transicao.
ziul diz:
tipo, as pessoas crescem, e a arte do varal muda no decorrer de sua vida, entende?

tatty ... diz:
a relação menino suja e moça lava é tipica de que homem pe burro e mulher sempre tem que solucionar tudo.
tatty ... diz:
tipo, mulher gosta de discutir relação, essas coisas

ziul diz:
caraca...melhor intepretacao a sua.
ziul diz:
uhauhahuahuuhaa
ziul diz:
vc tá toda fatalista lendo uma poesia tao simples.
ziul diz:
eu ia dizer q a arte do varal muda, qd criança é fralda, babador, depois vira macacao, camiseta, depois calça jeans, blusas estampadas, depois vira camisa social, terno, e por fim, coletes, boinas.

tatty ... diz:
tipo, o varal é o retrato da vida.

varal


Pendura-se tudo:
A calça, a blusa, a toalha molhada.
O tapete, o lençol, o cobertor
Até a cueca que tanto se esconde na roupa

Aceita tudo:
A blusa gasta da vó, a saia rendada da mãe
O terno preto do pai, e calça curta do irmão
Menos roupa suja que nunca vi por lá

Se for colorido de verde, azul, amarelo
Mesmo sem dourado, mais rico fica o varal?


Sem preconceito, o varal está lá
Obra de arte da dona de casa
Tão obra, e tão arte, que se renova
Enquanto o menino suja e a moça lava

Sendo varal pra secar,
quando chove e tudo molha
ele deixa de ser varal?

Vejo-o todos os dias quando vou ao quintal
E lá está, tão diferente, tão igual
Tão belo, tão morto, tão desigual

Não sei
Talvez nem seja verdade, mas prefiro achar assim:
Que um varal só existe pra brilhar os olhos pra mim


Luiz Antonio Ribeiro
18/06/06

03 junho 2006

justificando o injustificável

sobre o caso Suzane Hitchkoffen

Atire a primeira pedra quem nunca sentiu ódio. Não falo do ódio dissolvido pelo tempo, daqueles que duram meses, mas sim daquele que vem e dura momentos, segundos talvez, mas são tão fortes, tão profundos que rompem qualquer barreira da nossa racionalidade. Quem nunca bateu uma porta de raiva? Quem nunca quis socar a parede? Quem nunca arremessou um objeto qualquer? Não ouso dizer qualquer coisa sobre agressões físicas, mas nesse instante talvez você esteja pensando: "sim, eu já quis agredir alguém."

Existe uma idéia social, parte do senso comum, de que é ruim sentir raiva. Pior ainda, é inaceitável pensar em descarregar essa raiva, então o que fazemos é guardar, engavetar, fingir que não existem tais sentimentos dentro da gente. Gritar é barraco, chorar é fraqueza, fugir é covardia. Eis a virtude: fingir que não somos. Aí está o problema, temos uma sociedade de ovelhas sem sentimentos, que quase sempre são descarregados em formas singulares de prazer: festas, drogas, jogos, esportes. E assim, a sociedade vai bem, a máquina do mundo gira em perfeita harmonia.

Eis que um dia, uma menina mimada, criada para ser uma mistura de Barbie e Cinderela, cansa-se de todas as outras formas de extravasar, rompe com tudo que existe dentro dela, vê que não é de cera, não é bonita e não sabe sorrir de verdade, descobre que as drogas fazem ela não ser ela, e não ser dói. E no meio de tantos pensamentos descobre: "a culpa é dos meus pais".
Não sei se conheces o conflito da tragédia grega, mas ai está ele: homem x ordem. Não existe felicidade para a menina, enquanto seus algozes, travestidos de protetores continuarem sorrindo, a ordem foi comprometida, o prazer ou descanso familiar virou motivo de raiva. O mundo interno dela entra em rebuliço, pulsa, foge do equilíbrio, e as coisa começam a rumar para caminhos absolutamente desconhecidos. Totalmente fora de controle está a situação, não existe mais razão, o universo parece conspirar contra, a fim de se chegar a um equilíbrio. Enquanto isso, um amor recente, e forte, também domina a mente dela, que talvez, em certo momento, tenha dito a ele: "por favor, assuma para mim, decida para mim, salve-me." Ai, ela não é mais dona de si. A decisão de matar não é simplória, é uma mistura de pós-drogas, com amor, com noites mal dormidas, com ódio. Um ódio pulsando ao mesmo tempo em que a ordem precisava ser restabelecida. Nesse caso ou era a menina, ou eram os pais: a menina escolheu viver, na lei da sobrevivência.

E a imprensa cai em cima, crucifica ela, diz que o pai era bom porque fazia de tudo e que a mãe havia perdido noites de sono por ela. Dizem que ela é ingrata porque "tinha tudo que queria". Encaram o problema dela como loucura, como insanidade, vêem-na como bicho, como se seus instintos mais primitivos tivessem controle, e no caso, isso não é bom. Assim, ela passa de mão em mão, de boca em boca, e de notícia a notícia ela vai perdendo a vida, vai perdendo os impulsos, vai se tornando um objeto de exemplo, onde pensar é muito perigoso. Expo-la em praça pública talvez seja um bom negócio.

Se olharmos hoje em dia, não veremos mais uma pessoa, veremos apenas um instrumento da mídia de controle popular, com seus direitos confiscados, e que não paga apenas pelo seu erro, mas paga por Ter resolvido ir além e questionar o inquestionável, mudar o imutável, enquanto eu aqui, a muito custo, tento justificar o injustificável. Se não consigo, deixo assim, talvez seja mesmo melhor deixar incompleto.
Luiz Antonio Ribeiro
03/06/06

09 maio 2006

Amor s

Amor s. m.,

viva afeição que nos impele para o objeto dos nossos desejos;
inclinação da alma e do coração;
objeto da nossa afeição;
paixão;
afeto;
inclinação exclusiva;

Não, o dicionário não entende de amor. A denotação não tem a menor capacidade de formatar tal sentimento, e mesmo que tenha, ou que a tente, como aí em cima, a gente lê e na hora pensa: "não...isso não é amor." É porque amor é isso, mas também é muito mais. Ficar meia hora em silêncio, tocando de leve o queixo da pessoa amada, isso é amor e não está no dicionário. Ir dormir duas horas mais cedo que o normal, só para amanhã chegar mais rápido, sonhar com a pessoa, acordar uma hora mais cedo do que devia para o encontro e reclamar que ainda falta muito: isso é amor. Amor é aquela coisa que está entre o que a gente conhece e o que a gente não entende. Sabe quando a gente sabe exatamente aquilo que é, e aquilo que sente e aquilo que dói, daí vem alguém e pergunta: "que foi?" e faltam palavras? O amor está aí também. Porque palavra é linguagem, e linguagem é código, como código não comporta tudo que a gente tem dentro. Deus e toda definição dele é uma inutilidade, é uma inverdade máxima e o completo e total afastamento de deus. Falso sim, assim como o amor, mas muitas vezes vivo, forte e presente, porque no fundo, tudo se resume em a gente ser a gente mesmo. Amando ou não, com deus ou não.

Inclinação da alma e do coração; Minha alma se inclina por alguém? E meu coração? As formas são temporais, físicas, e a inclinação da alma e do coração requer viver em estado de paraíso, em estado de céu, para que assim, não se tenha o temor do tempo e do vento e da maré. O amor requer isso: uma certa quantidade de paz, para não cair em outros sentimentos que, de menos importantes, gritam muito mais dentro da gente. Inclinação de alma e coração é um pouco amor sim, mas é tão pouco amor. O amor está na sutileza dessa inclinação, está na sutileza da alma e na entrega do coração. Está no afeto, na gentileza e no carinho, nunca na pergunta vazia, nem na pergunta maldosa, mas na pergunta curiosa, daquele que quer virar ela, estar ela, ser ela. Virar um, o famoso clichê de "transformar-se na coisa amada, por virtude do muito imaginar".

A dúvida talvez seja, e o complexo, e o medo, e o a dor no rim esquerdo e a dor no pescoço de um beijo mal dado que a gente não consegue largar, que o amor não está nem perto de chegar a ser um pontinha de verdade. Ele não está em nenhuma dessas linhas, e depois de aprender a escrever, e de pensar tanto, e acima de tudo, amar tanto, para o bem e a para o mal, chegar a conclusão de que se está longe, bem longe do amor. Mesmo amando tanto e tão bem.

10/05/06
Luiz Antonio Ribeiro

27 abril 2006

vinte e quatro horas

"Não há porque voltar
Não penso em te seguir
Não quero mais a tua insensatez..."
Renato Russo

...aos poucos, junto com os primeiros raios de sol, ela foi se libertando do casulo. Aos poucos, a lagarta, que já era borboleta, ia se desfazendo de todo seu passado para um novo e breve futuro que se apresentava. Devagar, as asas foram se desprendendo do casulo, depois foi todo o pequeno e frágil corpo. Agora ela já era borboleta, mas não se movia, pois ser borboleta bastava. Agora ela era. O sonho de toda lagarta chegara.

Num silêncio da natureza, quase que mortal de tão nada silencioso, ela pela primeira vez mexe as asas. Foi um movimento de autoconhecimento. Apenas um chacoalhar. Porém, já mostrava suas cores: era linda, amarela, vermelha, com tons de marrom, mas não se podia precisar qualquer dominância entre as cores.

Depois de alguns minutos de sentir-se borboleta, ela movimenta-se de novo. Faz de uma maneira desajeitada, atabalhoada, mas segura. E quando menos se espera levanta vôo. Começa a conhecer tudo aquilo que sua intuição dizia existir, ou que então, algum descendente havia passado. Passeia por bosques, florestas, jardins, parques e folhagens. Passa por lindos lugares, experimentando essa sensação de voar, de observar o mundo e pela primeira vez, não ser observado. Sentia-se só, porém. Vivera sua vida só e agora que era linda, voava e tinha nela toda a maravilha da natureza, não podia permanecer assim. Alimenta-se e descansa em alguns lírios de um parque a hora do sol mais forte, e pouco depois sai em busca de companhia.

Nos bosques, encontra muitas borboletas, porém todas pareciam auto-suficientes e ignoravam seus apelos. Uma delas foge só de ouvi-la dizer: "você..." Descobre então, que não podia competir com aquele bosque, e vai-se para um parque. Lá encontra muita gente, correndo, andando de bicicleta, falando, gastando e comendo. Assusta-se com o tamanho da pessoa. Num canto, perto de um banco, vê um menino de calças curtas e camisa vermelha, sentado num banco com cara de choro. Aproxima-se, o posta-se ao lado dele. O menino olha, estica o dedo e a borboleta sobe em seu dedo. Ele olha para ela por alguns instantes e sorri, ela devolve-lhe o sorriso que ele não entende. Em instantes, ele tira o dedo e sai correndo em direção de alguns meninos. E a borboleta alça vôo de novo.

Num jardim, ela encontra apenas um beija-flor, que parece mal humorado e toma conta do local, ela tenta lhe dizer algumas palavras, mas ele parece nada sociável. Ela afasta-se e encosta próximo a alguns outros insetos. Todos excluídos. Havia ali, mosquitos, moscas e algumas mariposas, e ela a única borboleta, linda, sentindo-se só. Porém, os insetos incomodam-se com sua presença, e um a um voam para outro lugar e ela, tentando segui-los desiste e não vê para onde eles dirigem-se.

Anoitece, e a borboleta não está feliz. Nem triste. Está cansada. Sente um peso de uma vida que se tem e reclama de ter ganhado a vida que ganhou. Pois no fundo, ainda era lagarta, ainda era um ser como outro, ainda estava confusa. Não podia compreender essa metamorfose de nada a tudo, de feio a belo, não entendia ter que mudar por fora, quando a essência permanecia a mesma. Sem poder entender como era a vida de borboleta, ela enche-se de esperanças de poder descobrir isso nos próximos dias, já que estava borboleta a apenas algumas horas. Resolve então voltar para o casulo de onde saíra e lá, descansa. Dorme profundamente e ali fica para sempre. Mal sabia ela que borboletas só vivem vinte e quatro horas.

Luiz Antonio Ribeiro
01/07/05

07 abril 2006



Ela era a mais bonita da família. "Levem ela pra ser modelo", dizia uma tia velha insistente. Nada causava efeito até que a menina ganha o concurso de "Garota primavera" na escola. Disseram que ela possui talento, e a mãe resolveu, então, leva-la numa agência. "Claro." disse um olheiro olhudo, com as pupilas dilatadas, vendo dinheiro em seu futuro. A menina fez logo um book, e em pouco tempo já trabalhava para as principais empresas, ganhava um tanto de dinheiro que o olheiro deixava sobrar para ela, era cobiçava por muitos velhos tarados e invejada por alguns estilistas gays.

Fama, dinheiro, sucesso, beleza. Opa! O que todo mundo quer. Mas a menina não pediu nada, não perguntou nada e ninguém nunca chegou a se importar com o que ela pensava.

No entanto, ela continua andando e seguindo. Para onde? Para lá.

01 abril 2006



Não é por minhas mãos sujas de cansaço que me sinto abandonado. Não é por causa de minhas unhas sujas e roídas seguidamente, após crescerem insistentemente marcando o tempo que se esvai, que as vezes tenho impulsos de rebeldia. Não é por essas roupas velhas e por esse capacete que me esconde a cabeça e a inteligência que me sinto impelido a largar tudo e abraçar o inimigo. Nem é a saudade que quase sempre a noite me acorda do meu meio sono confuso que me faz pensar em desistir de tudo. Muito menos é por esse rifle, que em minhas mãos já causaram dor, mas que em minha companhia, já se fundiu em mim, criando um laço quase afetivo, que me lanço assim ao destino. De todas as dores, insistências, cansaços, sujeiras, descasos, mortes, infelicidades e saudades, o que mais me faz chegar no real sentido de onde eu posso estar é esse meu olhar.

Olhar que há muito já se foi, já não está em mim, já não reflete aquilo que sou, nem mesmo a radiante alegria de viver que tinha ao chegar aqui. "Defender a pátria" pensava eu. Um dia, talvez ele tenha visto que eu não defendo nada, apenas mato minha própria raça, a parte do mundo que é igual a mim. A gente não sabe construir uma coisa que está fora da gente.
Meu olhar, ou meu ex-olhar, perdeu o horizonte. Ele agora, vai solto, além dele mesmo, talvez viajando por campos, ranchos, bosques, parques, noites e dias. Não de paz, na minha utopia de vida, mas numa tranqüilidade serena de quem sabe que está vivo. Traze-lo de volta, talvez seja faze-lo sofrer um bocado mais, por isso ele se foi, e por isso eu deixei que ele se fosse. Ele já não dói.

À frente dele, uma trincheira que ele próprio não vê. Mas sei que ela existe, porque tenho a meu lado meus amigos. E por eles, meu pobre olhar enxerga. Meus companheiros de trabalho, de luta, ou cúmplices de nossos assassinatos contínuos em nome de alguma desconhecida paz. Ah, aventurado olhar que por perdido, ainda me mantém vivo.

Toca-se a trombeta, avisos de atenção. E em dois segundos estou a postos. Alinhamo-nos todos em fila, preparamos o ataque em alguém que em momento algum vai nos atacar. Sabedoria ou covardia? Já nem sei. Não fui trazido aqui para questionar. Corpo rígido, em forma. No lugar de um terço, aperto um pouco mais meu rifle, que torna-se quase sagrado, e sigo marchando. Entro num carro, me levam para outro lugar, onde em dois segundos começo a atirar. Levei um tiro? Isso é sangue? Caído estou, não tenho a noção exata, o barulho é alto e a correria também. Existe algum choro de criança por aqui talvez.

Não posso precisar nada, porque embora aqui esteja, meu olhar, que talvez seja minha alma, minha consciência, ou simplesmente uma parte minha perdida, já não está aqui. Sozinho, vaga por algum lugar bem melhor do que esse.

16 janeiro 2006

Ar-te

Genial por acaso
O feitor é reconhecido pelo que ele já não é
Tamanha é a ventura de uma primeira linha
Que o já sabido é desvio de sub-
consciência. Arte de quem não sabe
se é artista, o que é artista, e porque artista
Fazer por eletricidade e depois
Só poder reconhecer o fim da manifestação
Por vezes estética, outras tantas tecituras de idéias
O artista não faz arte, não tem nome
Quem o faz só o faz, sem saber
Há os que vivem, sem fazer e o são
Há os que não vivem porque o são
Há os que são sem ser.
No fim da linha do trem metafórico
somente há
E os artistas hão.

Luiz Antonio Ribeiro
16/01/06