03 fevereiro 2010

o caminho

O caminho de casa até a rua era sinuoso: passava por escadas, becos, entradas, casas vizinhas, um pequeno riacho-esgoto, algumas crianças a brincar, uma ponte em falso, alguns caminhões de obra e uma descida íngreme, até que culminava na movimentada rua. O rapaz, discreto, enquanto descia o caminho de sua casa, tentava não ser percebido, andava de cabeça meio baixa, ombro curvado, mochila nas costas sem fazer ruídos; pisava delicado, como se estive tentando não acordar a vizinhança, muito embora fosse ela inteira que fizesse todos os ruídos e não ele. O cinto mal ajustado incomodava e a camisa pra dentro da calça embora parecesse bonita, lembrava ele de que estaria por cima da cueca e que sem as calças a cena seria engraçada e até grotesca. Tinha vergonha do que era e principalmente do que era e estava escondido. O problema era: porque ter vergonha do que já escondia? Não sabia. Por isso que os becos, o riacho, a ponte, os caminhões e o cinto faziam tanto parte do que ele era e ali ele não queria ser visto. Era também aquilo tudo e gostaria de se misturar.
Chegou na movimentada rua e viu os faróis piscando, as buzinas tocando, as pessoas correndo, andando, falando ao celular, pouco entre si e muitos vendedores tentando ganhar a vida. Ali ninguém lhe percebia, era o oposto de tudo, podia andar altivo, forte, feliz, por mais que estivesse mal se misturava no movimento o que lhe dava a sensação de felicidade, tudo isso porque aquilo não lhe pertencia, logo poderia ser dele. Ou seja, o que não era dele estava em suas mãos como nunca enquanto que o que controlava não podia jamais ser seu, ou por fim sair fo controle. E nesse equilíbrio ele seguia pela cidade rumo ao trabalho. Talvez vá vencer.

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